Natália

Natália
Mauro Fernandes Barros

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

TRILOGIA DAS CORES



Já falei de Krzystof Kieslowski, cineasta polonês, aqui no meu blog (os ótimos filmes "Não Amarás" e "Não Matarás", da década de 80) e agora retorno com a "Trilogia das Cores". Depois de sair da Polônia e ir morar em Paris, desiludido com a política, Krzystof resolveu filmar as dores do mundo. A Trilogia das Cores, inspirada nas cores da bandeira francesa, e em seus significados, é um dos momentos mais poéticos do cinema na década de 90. Bleu, A Liberdade é Azul (1993), é o primeiro e é um drama. Julie (a bela Juliette Binoche de O Paciente Inglês) perde o marido (famoso compositor) e a filha pequena em um acidente de carro. Tenta se matar mas não consegue pois se acha fraca para fazer isso. Fica só. E ser livre é, muitas vezes, difícil. Um flautista de rua lhe diz que é preciso se agarrar a algo mas ela já não quer mais nada pois bens, recordações, amigos, vínculos, são tudo armadilha. Gostaria mesmo é de pular no espaço, no céu azul, mas no fundo sabe que não se pode renunciar a tudo. Kieslowski transforma dor em sublimação. Bleu é um filme silencioso mas todos os sentimentos são para qualquer um tocar. Cada um é livre para fazer o que quiser embora a liberdade maior seja estar vivo. A fotografia é linda. Em Blanc, A Igualdade é Branca (1993), é o segundo e o mais perto que Kieslowski chega de uma comédia. Para Karol Karol (Zbigniew Zamachowski), estar vivo não é nada fácil. Polonês de Varsóvia, vai à Paris e é humilhado. Sua mulher, Dominique (a linda Julie Delpy de Antes do Amanhecer e Um Lobisomen Americano em Paris), pede o divórcio pois diz que Karol Karol não "consumou" o casamento). Em Paris tudo dá errado, desde seu cartão de crédito ser cancelado até ser alvo de um tiro certeiro de um pombo. Acaba sem dinheiro, sem passaporte e sem esposa. Consegue voltar para a Polônia dentro de uma mala, mas ao chegar lá, a mala é roubada (sujeito de sorte esse). Quando, enfim, consegue chegar a sua casa, está todo arrebentado. Volta a trabalhar normalmente e com o tempo arquiteta um plano para montar uma fortuna que o possibilite aplicar as mesmas peças na ex-esposa, afinal, a igualdade é branca, como um véu de noiva, como a neve, como pombos voando e como um orgasmo. Blanc é cômico mas não chega a ser uma comédia. Kieslowski fez um belo filme que, se não fica a altura de Bleu e Rouge, com certeza alegra coração e alma. Em Rouge, A Fraternidade é Vermelha (1994), é o terceiro e último e é simplesmente sublime. Parece mais uma poesia sem palavras amparada em uma fotografia magistral e no rosto de Irene Jacob (musa de Kieslowski que havia feito com ele, dois anos antes, o misterioso A Dupla Vida de Verónique) flutuando em tons vermelhos de carros, sinais fechados, bolas de boliche, outdoors, cerejas e sangue. Irene é Valentine, modelo suíça vivendo em Paris, longe do namorado ciumento. Sua história é interligada a de um jovem que estuda para ser juiz. Certa noite, Valentine atropela uma cadela e ao leva-la ao endereço da coleira, conhece um estranho senhor que passa seus dias ouvindo ligações telefônicas dos vizinhos. Desse encontro surge uma amizade iniciada em repulsa mas que, aos poucos, modifica a vida dos dois personagens. Kieslowski brinca e se diverte com os acasos, com destinos marcados para se cruzar pois a inevitabilidade existe, embora cada um tenha que viver a sua própria vida. Para ele não é difícil adivinhar os caminhos da vida. Basta se comunicar. Olhar nos olhos. Rouge é arrepiante e sua cena final, uma pequena surpresa, mas só para quem assistiu aos outros dois. Ravel passeia com seu Bolero em várias cenas e é a base da excelente trilha sonora de Preisner. Rouge transborda poesia e possibilidades, em silêncios comoventes, mesmo quando caí um cinzeiro, mesmo quando vidraças se quebram, mesmo quando um alarme de carro dispara. É tudo como se incendiássemos gelo. Água que escorre entre os dedos e deixa, por fim, as mãos molhadas...Consagrado internacionalmente após a trilogia, em 1995, Kieslowski abandonou as câmeras por que disse que estava achando tudo muito chato e preferia viver ao invés de fazer cinema. E não fez mesmo. Não teve mais tempo. Morreu de enfarto, aos 55 anos, em março de 1996. A Trilogia das Cores é uma obra magnífica e tem uma interação entre eles sensacional, que não posso falar aqui agora, só vendo pra crer, sentir, acreditar, amar e surpreender-se.

2 comentários:

  1. Maurinho...Estou com esta Trilogia há 3 meses para assitir...Sei que é uma preciosidade e estava esperando um momento especial para assitir, enfim, agora você acelerou a minha vontade, além do mais, verei com um olhar muito mais atento após ler a sua resenha, depois te conto...
    Abçs, Pattricia

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  2. Finalmente assisti a Trilogia. Uma atrás da outra. Entre lágrimas, identificações, estranhamento. Não entendi porque demorei tanto para ver. Mas enfim... Realmente é de parar o fôlego daqueles que um dia já se sentiram um pouco como cada personagem de Kieslowski. O final é mesmo surpreendente. Um filme e tanto...

    Vou rever sempre que puder... Quem sabe na companhia de vc e de Quel ?

    Não sei se viu 'Há tanto tempo que te amo' do Phillipe Claudel. Um filme e tanto. Aposto que se não o viu vai adorar...

    Abçs, Patti

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