Natália

Natália
Mauro Fernandes Barros

segunda-feira, 1 de março de 2010

TEOREMA


Estou com a obra completa de Pier Paolo Pasolini (1922-1975), um grande homem, um italiano espetacular (sempre lutou por grandes causas), poeta, jornalista e um mestre na arte de provocar a revolução. Já assisti o chocante (chocante mesmo, sadomasoquismo, sexo, violência, até banquete de bosta tem... rsss) "Saló, os 120 dias de Sodoma", sua última obra, de 1975; "Mamma Roma"; "Decameron" (ô putaria...); "O Evangelho Segundo São Mateus"; e ontem assisti "Teorema", clássico de 1968, simplesmente incrível, chocante, belo, sensual, triste... Não vou resistir e vou comentar o filme todo, portanto,SE VC AINDA NÃO VIU NÃO LEIA ESTA SIMPLES RESENHA. Milão, ano de 1968, um misterioso rapaz se hospeda na casa de um rico industrial. Aos poucos o estranho muda pra sempre a vida de todos no lar, da empregada à matriarca. É o início da degradação desta família burguesa. O cara então sai comendo todo mundo (me perdoem o modo chulo... rsss): primeiro o filho, depois a empregada, a mãe, a filha e o pai... só não comeu o cachorro p/q não tinha...kkkkk... Qdo deixa a casa a pertubação causada pela sua falta é total. O desespero de cada personagem é relatado de um modo profundo, forte, instigante... faz com que mergulhemos no interior de cada um tamanha é a sensibilidade de construção das imagens e narrativas ali expostas...um verdadeiro tratado sobre o caos psicológico do ser humano. A amargura das personagens é sentida através de um denso silêncio, onde se obtém maior riqueza de sentidos. A erosão contínua de um terreno arenado no decorrer do filme serve como metáfora para o processo de ruptura e exteriorização do caos psicológico no qual vivem as personagens. As atrizes que fazem mãe e filha são lindas. A mãe, na casa dos trinta e tantos (como eu, mas não perguntem os tantos...) é linda, maquiadíssima, cabelo fashion, roupas legais (o interessante do filme tbém é ver modos e costumes do ano de 1968, pois por mais que uma produção contemporânea tenha uma reconstituição de época legal sempre tem uma repaginada...), a filha (16, 17 anos) linda linda linda... o interessante é que vc enxerga nelas a real idade delas, e em seus rostos o desespero, o desejo á flor da pele, o medo, a entrega... Vc sente todos estes sentimentos através das marcas dos rostos, dos olhares, das bocas, das olheras, mesmo de uma jovem... Diferente às vezes no cinema atual, vi um trecho do novíssimo "Nine", com Nicole Kidman e Penélope Cruz, divas com mais de 40, e o que se vê é tanta produção e "photoshop" nas caras delas quer perdem a sensibilidade nos rostos... deixam de ser rostos... Somado à sensibilidade nua e crua de todos os rostos no filme, temos gemidos, discretos e quase suaves... Senti nas personagens pessoas mais ou menos normais, do cotidiano... O filme tem uma fotografia incrível, uma névoa que nem o sol de meio dia consegue dissipar... pode ser primavera ou o início do outono europeu, as árvores que circundam alguams cenas são em extensas filas regulares, tem folhas secas ou quase nenhuma. E o vazio que o jovem misterioso deixa em cada personagem é como um vazio que às vezes nós mesmos sentimos, quando ninguém quer ouvir as tristezas e desgraças de ninguém, pois cada um tem as suas próprias... A empregada solteirona de meia idade que pira (acho que foi sua única experiência sexual) e volta para a casa dos pais, uma simples colônia, onde se senta em um banco ao ar livre e dali não sai mais tamanha sua tristeza e se enterra viva, não para morrer mas para chorar... e as pessoas da pequena vila achando se tratar de uma santa milagrosa. Neste momento a música é incrível, como se fosse uma personagem. A jovem que entra em estado de choque, o irmão que coloca pra fora seus sentimentos através de pinturas que retratam sua própria decrepitude... a mãe que para compensar o vazio de sua vida se entrega ao sexo com jovens desconhecidos que busca nas ruas (tem uma cena incrível que ela volta ao local onde transou com um jovem e entra em uma igreja... ela na porta, linda, a tomada feita de dentro pra fora, as árvores secas ao fundo... aí ela fecha a porta e entra... é linda a cena, de uma simplicidade e maestria, arte pura... E a cena final, onde o patriarca em uma estação de trem, bombardeado com todos e tudo, e principalmente com si mesmo, flerta com um rapaz... e de surto, tira toda a sua roupa e se transporta para outro mundo em total desespero... e grita, grita, grita como aqueles dias em que tbém temos necessidade de gritar, mas ficamos calados.. um grito de desespero que leva ao fim... e termina o filme... e até agora estou espatafado. "Teorema" é aclamado pela crítica como a obra prima de Pasolini e ficou proibido durante anos em vários países, tornando-se uma lenda no meio cinematográfico.

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