Apesar da correria, arrumei um tempinho para reler e rever "A Insustentável Leveza do Ser". O filme de quase 3 horas de duração começa sutilmente, de mansinho, com uma música que roça o cômico. Demasiado leve. E depois cresce, cresce, cresce, a cada minuto que passa. Subitamente a música torna-se séria. E então aí encontramos a perfeição e a beleza estampados numa tela de cinema. Baseado naquela que é, talvez, a obra-prima do escritor Checo MilanKundera, "A Insustentável Leveza do Ser" (lançada em 1984) ganha na tela novos contornos pela mão do diretor Philip Kaufman (lançamento de 1988). As linhas descritas nas páginas ganham vida própria, as personagens ficam ainda mais belas, a história entra na nossa pele. Tomaz (Daniel Day-Lewis) é um jovem médico que vive na Praga de 1968, dividido entre duas mulheres, Tereza (Juliette Binoche) e Sabina (Lena Olin). Juliette Binoche encarna, com a sua Tereza, uma timidez que não choca, uma leveza de espírito que fascina, um erotismo que surpreende. Já Sabina é o oposto: é a mulher nua do chapéu na fantástica foto do cartaz do filme e na cena inesquecível, que faz amor em frente a um espelho e que conhece Tomaz como ninguém: os seus desejos e medos enquanto homem. E a história desenrola-se assim, num equilíbrio de emoções, nos prazeres que causam dor. Não é apenas a história de um triângulo. A Insustentável leveza do ser é amor misturado com história, com arte, com cultura. Não é apenas um simples filme, é um documentário ficcionado. E esse detalhe é facilmente denotado na forma impressionante como Kaufman faz a ligação entre as personagens e a Primavera de Praga. Tereza e Tomaz parecem ser figuras presentes de uma revolução, a fotografia é simplesmente perfeita. Não fosse a revolução, não fossem aspectos autobiográficos do próprio MilanKundera misturarem-se com as vidas de Tomaz e Sabina, não fosse um simples espelho e um chapéu, bem como as fotografias de Tereza, o filme seria apenas uma tela preenchida com lugares-comuns, e o livro do escritor checo ganharia contornos a roçar a vulgaridade. Mas, felizmente, os simples pormenores ajudam sempre a criar as coisas mais belas.
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